Um tempo para preparar o “estábulo” do nosso coração

Como na Quaresma, o esforço espiritual que somos chamados a realizar durante o Advento deve ser sério e fervoroso. Consideremos estas semanas que antecedem o Natal uma oportunidade de preparar o “estábulo” de nosso coração para receber o Menino Jesus.

Pe. Robert NixonTradução: Equipe Christo Nihil Praeponere

10.Dez.2021Tempo de leitura: 7 minutos

O tempo do Advento, como o da Quaresma, é de preparação fervorosa, dirigida para Deus. Enquanto na Quaresma nos preparamos para a bendita Paixão e gloriosa Ressurreição de Nosso Senhor, no Advento nos preparamos para a sua Encarnação; a vinda a este mundo, no tempo e no espaço, de Jesus Cristo, o próprio Deus. Neste, o mais impressionante dos mistérios, a divindade não se “disfarçou” simplesmente como um mortal, mas assumiu a nossa humanidade.

É luminoso notar que, de acordo com a antiga tradição da Igreja, sempre que o mistério da Encarnação é mencionado, inclina-se a cabeça em forma de reverência. Indiscutivelmente, a Encarnação foi o maior milagre de todos, pois por meio dela Deus, que é totalmente infinito e transcendente, foi verdadeira e inseparavelmente unido à nossa humilde e finita condição humana. Ao tomar parte nela, Ele não só a redimiu do domínio do pecado, da morte e de Satanás, mas a elevou para fazê-la participar de sua própria glória inefável. De acordo com Santo Atanásio, “Deus se fez homem para que nos fizéssemos Deus”.

Como na Quaresma, a preparação que somos chamados a realizar durante o Advento deve ser um esforço sério e fervoroso. Embora a ênfase na Quaresma seja mais penitencial, o Advento é também um tempo de exame cuidadoso e honesto da própria consciência, vida e pensamentos — bem como de esforço por um verdadeiro crescimento na fé, esperança e caridade. Talvez possamos considerar essas semanas que antecedem o Natal como uma oportunidade de preparar o “estábulo” de nosso coração para receber o Menino Jesus.

Consideremos estas semanas que antecedem o Natal como uma oportunidade de preparar o “estábulo” de nosso coração para receber o Menino Jesus.

Que aspirações particulares podemos perseguir durante este tempo? Para responder a essa pergunta, podemos perguntar com pertinência: “Que condições devem estar presentes em uma casa que se prepara para a chegada de um novo bebê?” Há três coisas que imediatamente vêm à mente: limpezapaz e suprimentos generosos de alimento e amparo. Cada católico pode considerar proveitosamente sua própria vida à luz desses três aspectos, durante esta época de preparação para o Natal.

Em primeiro lugar, podemos nos perguntar: “Minha vida e meu coração estão suficientemente limpos e arrumados para receber dignamente o santo Menino?” Claro, isso nunca é realmente possível para qualquer ser humano — com a exceção singular da Imaculada e Santíssima Virgem Maria. Afora Cristo e sua gloriosa Mãe, nenhuma alma humana está completamente livre da mancha do pecado durante esta vida mortal.

Mesmo aceitando essa realidade inescapável, porém, é bom que nos perguntemos se, ao olhar com honestidade para nossas vidas e corações, não vemos um pouco de “lixo” demais por todos os lados. Existe alguma sujeira ou imundície escondida nos cantos? Há alguma coisa presente que acharíamos embaraçosa ou, pior, de que nos envergonhamos? Deixamos acumular camadas de poeira sobre o que é de maior valor — nossa fé, nossa piedade e nosso amor? O Advento é o momento ideal para fazer uma limpeza branda, mas cuidadosa.

“Um anjo aparece aos pastores de Belém”, por Walter Rane.

Limpeza por si só não é o suficiente, todavia, para criar um ambiente adequado a uma criança pequena. A paz também é essencial. Quando olhamos nossos corações, o que encontramos? Um silencioso “espaço interior” de oração? Um refúgio de tranquilidade interior? Um terreno pacífico onde as flores do amor a Deus e ao próximo brotam em toda a sua beleza radiante?

Ou talvez encontremos um campo de batalha, com paixões violentas e impulsos conflitantes? Ou um vulcão fervente, com desejos ocultos e prejudiciais? Talvez vejamos o leão rugindo de raiva e cólera? Um pavão orgulhoso? A serpente luxuriosa? Ou um porco guloso? Talvez os pensamentos maliciosos e rudes estejam sobrevoando nossos corações, como tiros e disparos de canhões, mesmo que nunca os deixemos transparecer em nossas palavras ou comportamentos.

Que cada um de nós considere se o seu coração é realmente um lugar onde o Menino Jesus poderia descansar, com segurança e paz. Para a maioria das pessoas, na maioria das vezes, é provavelmente justo dizer que a resposta é “não”. Aqui, no entanto, devemos olhar para fora de nós mesmos e além daquilo que nos rodeia, voltando nosso olhar para o alto — para a infinita bem-aventurança e glória de Deus, para a paz e as inimagináveis delícias do Céu, para o amor e misericórdia sem limites de Jesus, para a pureza e o esplendor de Maria.

É somente nessas coisas que a verdadeira paz pode ser encontrada, e que quaisquer turbulências e guerras que se enfureçam dentro de nós podem ser acalmadas. Por meio dessa contemplação, poderemos obter a paz que torna nosso coração pronto para receber nosso pequeno Salvador.

É pertinente notar, porém, que tanto a limpeza quanto a paz — embora certamente sejam admiráveis e condições necessárias para receber um filho recém-nascido — não bastam por si mesmas. Um hospital bem organizado e clinicamente higiênico pode estar perfeitamente limpo e ser administrado com a mais ordeira calma. Todavia, esse ambiente não é ideal para criar um bebê, pelo menos a longo prazo. Pois, mesmo com a ausência de tudo o que seja prejudicial ou nocivo, os elementos positivos de afeto, energia emocional, personalidade e amor podem não estar presentes.

É somente em Deus que a verdadeira paz pode ser encontrada, e que quaisquer turbulências e guerras que se enfureçam dentro de nós podem ser acalmadas.

Da mesma forma, nossos preparativos espirituais envolvem não apenas um esforço para eliminar a poeira e a sujeira do pecado e do vício, ou acalmar a agitação da paixão e do conflito. Além disso (e talvez mais importante do que isso), precisamos criar um ambiente que seja genuinamente amoroso e acolhedor, caloroso e agradável. É aqui que os católicos devem trabalhar constantemente para assegurar que sua fé e vida de oração estejam bem fundadas e sejam bem nutridas.

Para empregar como analogia algo que seja talvez um tanto quanto comum, uma pessoa que tem um entusiasmo, um hobby ou um interesse em particular normalmente adquire recursos e material que apoiem e estimulem seu interesse. Um músico terá um instrumento (ou talvez mais de um), bem como partituras, gravações, livros de instrução, biografias de outros músicos e assim por diante. Um atleta terá todo o equipamento de que precisa para sua prática esportiva, além de diversos aparelhos de treinamento, bibliografias, vídeos, suplementos nutricionais e muito mais.

“A Adoração dos Pastores”, por Juan Bautista Maíno.

Devemos levar nossa fé, que muitos católicos consideram o elemento mais importante e fundamental de suas vidas, menos a sério do que muitas pessoas levam seus hobbies? Alimentamo-nos de literatura, imagens e ideias que sustentem e estimulem nossa fé? De fato, nossa tradição católica é tão rica que nos oferece tesouros praticamente inesgotáveis, em forma de orações, exercícios devocionais, meditações teológicas, vidas de santos e muito mais. O catolicismo nunca foi uma religião “puritana”, mas abraça essa riqueza de imagens e material para nos aproximar de Deus e inflamar nosso coração com amor e devoção.

Cumpre-nos trabalhar para tornar nossos corações (e mentes) lugares calorosos e acolhedores para Cristo quando Ele vier como criança neste Natal — o tipo de lugar onde Jesus se sentirá verdadeiramente amado e genuinamente “em casa”. É claro que não há maneira mais eficaz de fazer isso do que através da presença amorosa de sua própria Mãe, a Virgem Maria. Pois o Menino Jesus, como qualquer bebê humano, deseja ardentemente estar onde está a sua mãe.

Ao cultivar nossa devoção à Rainha dos Anjos, não apenas afastamos o pecado e a tentação e nos aproximamos da bendita paz do Céu, mas também atraímos Jesus para nós. Afinal, é a Mãe quem sabe preparar melhor uma morada para o seu divino Filho. Por isso, Maria deve ser a nossa companheira mais próxima durante o tempo do Advento. A fim de preparar nosso coração para receber o Menino Jesus no Natal, precisamos garantir que ela esteja presente e seja devidamente amada, honrada e reverenciada.

Trabalhemos, pois, em tornar-nos “estábulos” prontos para acolher Cristo; trabalhemos para nos purificar do pecado e do vício; esforcemo-nos por acalmar quaisquer tempestades e batalhas que venham a assolar nossas almas. Mas, acima de tudo, acendamos o fogo do amor e da devoção, a fim de criar para Ele um ambiente acolhedor, generoso e familiar. Ao fazer isso, Maria, a serva do Senhor, certamente estará presente para nos ajudar e guiar com seu amor e sabedoria maternais.

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